APELAÇÃO CÍVEL. SUCESSÕES. AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA. ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. AUSÊNCIA DE DESCENDENTES E ASCENDENTES. CÔNJUGE SUPÉRSTITE. DIREITO À TOTALIDADE DA HERANÇA. PREFERÊNCIA EM RELAÇÃO AOS COLATERAIS. REGIME DE BENS DO CASAMENTO. IRRELEVÂNCIA. Na ausência de descendentes e ascendentes, o cônjuge supérstite antecede os colaterais, conforme a ordem de vocação hereditária, razão por que receberá a totalidade da herança, sendo irrelevante o regime de bens que regulou o casamento. Inteligência dos artigos 1829 c/c 1838 do atual Código Civil, legislação aplicável ao caso concreto. Sentença confirmada. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70052654118, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 20/02/2013)
DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto por VERA S. DA C., inconformada com a sentença da fl. 73 que, autos de “ação de petição de herança” ajuizada em desfavor de ROBERTO N. DA S., indeferiu a petição inicial apresentada.
Nas razões, em síntese, argumenta que, na condição de irmã, é herdeira de sua irmã Elizabete S.. Sustenta que o agravado, por ter contraído núpcias com a Elizabete pelo regime da separação total dos bens, não detém direitos hereditários, uma vez que os cônjuges teriam deliberada e conscientemente optado pela incomunicabilidade patrimonial. Aduz que a petição deve ser recebida, tendo em vista a condição da apelante de herdeira universal. (fls. 75-94).
Recebido o recurso e mantida a decisão (fl. 96), subiram os autos, aderindo parecer do Ministério Público (fls. 102-103) pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Decido.
2. Presentes os pressupostos processuais, conheço do recurso interposto.
Adianto, não assiste razão à apelante.
Segundo os autos, ELIZABETE S., falecida em 23/07/2012 (fl. 21), era casada com Roberto N. da S. desde 12/09/2008. O casal não teve filhos (fls. 21 e 29).
Os ascendentes da de cujus faleceram em 1995 e 2005. (fls. 22 e 23)
A apelante, irmã da falecida Elizabete, sustenta ser sua única herdeira.
Pois bem.
Inicialmente, importa rememorar que a sucessão e a legitimação para suceder são regulamentadas pela lei vigente ao tempo de sua abertura, nos termos do art. 1.787 do Novo Código Civil (em vigor desde 11/01/2003), que assim dispõe:
Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela.
Por sua vez, dispõe o art. 1.820 do mesmo Diploma Legal:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
Prescreve, ainda, o art. 1.838 também do CC/2002.
Art. 1.838. Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente.
No caso em exame, como visto, restou comprovado que tanto o casamento quanto o óbito ocorreram na vigência do atual Código Civil, evidenciando-se, também, que Elizabete faleceu sem deixar ascendentes ou descendentes.
Assim, consoante o disposto nos artigos supracitados e diante das informações acima elencadas, tem-se que Roberto N., cônjuge sobrevivente, precede a apelante Vera S. (irmã da falecida – herdeira colateral, portanto) na ordem de vocação hereditária, razão por que receberá a totalidade da herança, sendo irrelevante o regime de bens que regulou o casamento, tanto que o art. 1.838 não faz qualquer distinção. O direito sucessório, como bem sublinhou a magistrada sentenciante, “não se confunde como direito de meação afeito à separação/divórcio.”
Sobre o tema, leciona SALOMÃO DE ARAÚJO CATEB, no seu livro Direito das Sucessões, 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2007, pp.74 e 75:
“É irrelevante o regime de bens, na data da celebração do casamento, para o chamamento do cônjuge como terceira classe. Desde que inexistam herdeiros necessários, a herança é deferida ao cônjuge supérstite. Também, nesse sentido, “o Cônjuge é, por força de lei, herdeiro do cônjuge pré-morto, independentemente do regime de bens, bastante apenas a inexistência de descendentes ou ascendentes e a inexistência de dissolução conjugal pelos modos expressos nos incisos II a IV do art. 2º da Lei no 6.515/77”.
Neste sentido também a jurisprudência:
INVENTÁRIO. ARROLAMENTO. INVENTARIANÇA. CÔNJUGE SUPÉRSTITE. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. 1. Se o de cujus não deixou nem descendentes, nem ascendentes, o cônjuge é chamado a suceder, pois ocupa o terceiro lugar na ordem de vocação hereditária, sendo absolutamente irrelevante o regime de bens do casamento. Inteligência dos art. 1.829, inc. III, e art. 1.838 do CCB. 2. Por ostentar a condição de herdeira, compete à viúva preferencialmente o exercício da inventariança. Inteligência do art. 990, inc. III, do CPC. Recurso desprovido. (Apelação Cível Nº 70016532376, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 08/11/2006)
ARROLAMENTO AJUIZADO PELOS HERDEIROS COLATERAIS. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CÔNJUGE SUPÉRSTITE. CASAMENTO SOB O REGIME DA SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS. IRRELEVÂNCIA. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. Inexistindo descendentes e nem ascendentes, o cônjuge sobrevivente recebe por inteiro a herança, independentemente do regime do casamento ser o da separação total de bens. Incide, no caso, a ordem de vocação hereditária. Inteligência dos art. 1.829, inc. III, e art. 1.838 do CCB. NEGADO SEGUIMENTO (Apelação Cível Nº 70021686548, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Claudir Fidelis Faccenda, Julgado em 12/11/2007)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. CÔNJUGE SOBREVIVENTE CASADO PELO REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. Na falta de descendentes e ascendentes o cônjuge sobrevivente é herdeiro, independentemente do regime de bens adotado no casamento (art. 1838 do Código Civil). AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. EM MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº 70019414796, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 09/05/2007)
O parecer do Ministério Público trilha a mesma linha de raciocínio. Confira-se:
(…) a recorrente confunde os preceitos concernentes ao direito de família (regime de casamento), com os atinentes ao direito sucessório.
Com efeito, o fato de ter sido estipulado entre os cônjuges o regime de separação de bens significa que não há meação a ser destacada do patrimônio inventariado, e não que, no caso de morte, o cônjuge supérstite deva ser excluído da sucessão.
Trata-se, a propósito, de regra expressa disposta no artigo 1.829 do Código Civil, revelando-se desnecessárias as discussões propostas sobre a origem do patrimônio inventariado ou da participação da agravante na construção e na manutenção do estabelecimento familiar. Isso porque, ainda que eventualmente demonstradas tais questões, não tornarão a agravante herdeira de sua irmã. O cônjuge prefere os colaterais em matéria sucessória, não merecendo, em consequência, reparos a decisão recorrida.” (fls. 102-103)
3. ANTE O EXPOSTO, com fulcro no art. 557, caput, do CPC, nego provimento ao recurso de apelação.
Dil. Legais.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2013.
DES.ª SANDRA BRISOLARA MEDEIROS,
Relatora.