Confira os comentários do Promotor de Justiça Cristiano Chaves de Farias, do MP da Bahia, coautor da obra Curso de Direito Civil – Famílias (Ed. Juspodivm), na matéria elaborada pelo IBDFAM sobre a aplicação da teoria da perda de uma chance em casos de abandono afetivo:
No último sábado (15) , a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou a teoria da perda de uma chance em um caso de erro médico. O colegiado concluiu, seguindo o voto da ministra relatora Nancy Andrighi, que as chances perdidas, por força da atuação do médico, têm conteúdo econômico equivalente a R$96 mil, a título de indenização. A ministra Nancy Andrighi afirmou, em seu voto, que o STJ vem enfrentando diversas hipóteses de responsabilidade civil pela perda da chance, na qual o agente tira da vítima uma oportunidade de ganho.
De acordo com o REsp. nº 1.190.180/RS do Superior Tribunal de Justiça, a teoria da perda de uma chance – desde que essa seja razoável, séria e real, e não somente fluida ou hipotética – é considerada uma lesão às justas expectativas frustradas do indivíduo, que, ao perseguir uma posição jurídica mais vantajosa, teve o curso normal dos acontecimentos interrompido por ato ilícito de terceiro.
Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do IBDFAM, na Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, nº 25 Dez/Jan de 2012, questiona a não utilização da teoria em caso de abandono afetivo. “Ora, se uma das fundamentações jurídicas para condenar o abandono material foi o uso da teoria da perda de uma chance, porque não pelas mesmas razões não se aplicou para condenar por abandono afetivo, utilizando a máxima do cuidado ao próximo?”- ressalta.
Para comentar a possibilidade da aplicação da teoria da perda de uma chance nos casos de abandono afetivo, convidamos o presidente da Comissão de Promotores de Família do IBDFAM, Cristiano Chaves de Farias.
Na sua opinião, é possível aplicar a teoria de perda de uma chance nos casos de responsabilidade civil por abandono afetivo?
Sim. Observe-se que o fundamento da teoria da perda de uma chance é, exatamente, a subtração de uma oportunidade futura ou da possibilidade de eliminar uma desvantagem. Não há uma premente necessidade de que esta vantagem que seria obtida tenha essência patrimonial, econômica. Sendo assim, vislumbra-se com tranquilidade a possibilidade de aplicação da teoria para justificar a subtração de um pai, por exemplo, a oportunidade de convivência (profícua) com o seu filho, em casos nos quais a mulher esconde a paternidade do genitor.
Em quais princípios está fundamentada a teoria da “Perda de uma Chance”?
A teoria tem assento no princípio da solidariedade social (artigo 3o da Constituição Federal), bem como no princípio da reparação integral dos danos. Se todo dano merece reparação pelo sistema jurídico, a perda de uma chance não pode escapar a essa possibilidade.
Como o senhor avalia a postura do judiciário, que tem negado provimento à maioria das ações de indenização por abandono afetivo?
Até mesmo pela novidade que representa a teoria, é natural uma certa postura conservadora. Afinal, como diz a música, “a mente apavora o que não é mesmo velho…” Contudo, vale a lembrança que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem diversos precedentes reconhecendo a incidência da teoria em casos diversos, dando contornos de efetividade.
Essa teoria ajuda a formar precedentes para embasar os tribunais regionais no sentido de dar provimento a ações de indenizações por abandono afetivo?
Não necessariamente. A questão da perda de uma chance estabelece um senso de responsabilidade na relação entre homem e mulher, sob o prisma do direito de ambos à filiação. Mas não vislumbro uma correlação direta com a responsabilidade civil por abandono afetivo, que está baseada em outras premissas teóricas, distintas das que sustentam a perda de uma chance.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM – 19.12.2012