Para partilhar as dívidas no término da união estável, é preciso provar que foram feitas em benefício da família

A 4ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve decisão da comarca da Capital que negou pedido de um homem em compartilhar dívidas contraídas durante união estável com a sua ex-companheira. O homem não apresentou provas de que as dívidas de empréstimos e produtos adquiridos em prestação foram feitas em benefício da unidade familiar.

O desembargador Eládio Torret Rocha, relator da apelação, admitiu a presunção de que a dissolução de união estável, em regime de comunhão parcial de bens, comporta a divisão tanto de bens como de dívidas adquiridas na constância da relação. No entanto, havendo a pretensão de partilhar pendências financeiras contraídas unicamente por um dos conviventes, “necessária é a demonstração, de modo induvidoso, de que elas reverteram em favor da unidade familiar”. De acordo com o processo, parte dos empréstimos contraídos pelo homem nem sequer era de conhecimento de sua ex-companheira. A decisão foi unânime.

Para o professor Waldyr Grisard Filho, presidente da Comissão de Ensino Jurídico de Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a decisão está correta, visto que o homem não comprovou que as dívidas que pretendia incluir na partilha foram contraídas em benefício e na satisfação de encargos domésticos da entidade familiar.

O professor explica que as relações de casal não se limitam ao “meramente sentimental” e afetivo, mas também geram gastos, “aos quais devem concorrer os cônjuges ou companheiros, na proporção de seus bens  e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família”. Nesse sentido, as dívidas contraídas na constância da união, para atender os encargos familiares, são de responsabilidade do casal.

“Pelo artigo 1.643 do Código Civil, cada consorte está autorizado a realizar despesas  necessárias à economia doméstica e a obter empréstimos de quantias para suprir tais despesas. Estabeleceu o Código uma recíproca e mútua presunção absoluta de consentimento por conta da qual, independentemente de quem tenha realizado a dívida, ambos por ela respondem (CC, art. 1.644). A ambos compete a administração dos bens comuns (CC, art. 1.663), salvo disposição em contrário em pacto antenupcial ou contrato de união estável (CC, art. 1.665). Às obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender os encargos familiares, as despesas de administração, e às decorrentes de obrigação legal, respondem os bens da comunhão (CC, art.1.664). Tratando-se de despesas realizadas com bens particulares de cada um, em benefício próprio, essas competem  ao cônjuge ou companheiro proprietário (CC, art. 1.665) e por elas não responde a massa dos bens comuns. Não há como ser diferente”, diz.

Ônus da prova – No caso, o TJSC entendeu que cabia ao homem o ônus da prova, ou seja, ele deveria provar se as dívidas foram ou não feitas em benefício da família. Segundo Waldyr Grisard, o entendimento está correto. “A quem cabe comprovar se um dos consortes obteve ou não proveito pela dívida contraída pelo outro, pergunta Maria Berenice Dias (Manual, 10ª Ed., p. 318): é ao cônjuge do devedor que cabe demonstrar a ausência de proveito ou compete ao cônjuge credor provar o beneficiamento? Como há a presunção de que os gastos são feitos em proveito da família, ao cônjuge credor de meação da dívida compete o ônus da prova ter havido benefício à unidade familiar. Isso decorre do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil: quem alega, tem de provar. Se os débitos foram contraídos em benefício da família, vinculam ambos os consortes. Se estranhas aos interesses da família, somente quem as contraiu é o responsável com seus bens particulares. Na situação acima reproduzida, em síntese, entendeu corretamente o Tribunal de Justiça não ser possível impor à ex-companheira a prova negativa do proveito comum”, ressalta.

Fonte: TJSC – 17/02/2016.